Olá, tudo bem?
Trago notícias um pouco diferentes. Falarei aqui do nosso próximo curso, como sempre, mas também falarei um pouco do futuro da Literária. Afinal, agora que temos um novo presidente eleito no Brasil, parece que a gente pode não só continuar a sonhar, mas também começar a voltar a fazer planos.
Essa foi uma vitória de todas as mulheres e homens que amam a democracia, que querem liberdade, que querem um país mais justo. Essa foi a vitória das pessoas que querem mais cultura, que querem mais educação, que querem mais fraternidade, mais igualdade.
[…]
Foi uma campanha daquelas pessoas que amam a educação, daquelas pessoas que amam ciência e tecnologia, daquelas pessoas que amam a cultura, daquelas pessoas que querem mais cultura, daquelas pessoas que querem trabalhar e ser remuneradas de forma decente, daquela mulher que quer um salário igual ao homem, exercendo a mesma função.
[…]
Eu quero que vocês saibam que vamos recuperar o Ministério da Cultura e vamos criar comitês estaduais de cultura. Para que a cultura se transforme em uma coisa para que as pessoas tenham acesso, para que a cultura se transforme numa cultura de produzir emprego e de gerar renda. Quem tem medo de cultura é quem não gosta do povo, é quem não gosta de liberdade, é quem não gosta de democracia, e nenhuma nação do mundo será uma verdadeira nação se não tiver liberdade cultural.
Trechos do discurso da vitória de Lula, proferido em 30 de outubro de 2022 na Avenida Paulista
Para quem trabalha com literatura e cultura e manteve todos ou quase todos os planos profissionais em suspenso — ou continuou trabalhando neles, ainda que de forma total ou parcialmente precarizada desde o golpe contra a presidenta Dilma —, uma previsão de melhora, por menor que seja, já é bastante animadora. Até porque os desafios são imensos e as urgências se acumulam — algumas, muito mais urgentes do que outras, são prioridade, como sabemos. Viver no Brasil nunca foi para amadores, e isso já era verdade antes mesmo de Tom Jobim sequer cogitar cunhar a frase “o Brasil não é para principiantes”.
Ainda estava lembrando do discurso do Lula — que tive a sorte de ouvir da calçada em frente ao MASP, na companhia de pessoas queridas — quando recebi por e-mail a edição da newsletter em que a escritora Aline Valek retoma uma fala recente da atriz Denise Fraga, que circulou bastante na semana anterior ao segundo turno.
Entre tantas palavras que serviram de boias salva-vidas nos últimos dias, lembro de um discurso muito bonito da atriz Denise Fraga durante a campanha de Lula. Ela lembrava que as palavras estampadas na bandeira brasileira, “Ordem e Progresso”, vieram do filósofo Augusto Comte: “O amor por princípio, a ordem por base e o progresso por fim”.
Talvez — ela especulou — tivessem deixado o amor de fora da bandeira porque parecia algo tão básico, tão fundamental, que estivesse ali habitando nas entrelinhas. Mas vimos que nem sempre o amor é tido como princípio.
Aline termina o texto da newsletter lembrando que o amor precisa ser dito e praticado. Na vida, nas nossas relações, no trabalho, na nossa forma de fazer política. Porque se a nossa bandeira não nos une, talvez essa seja a bandeira que pode nos unir.
Me peguei pensando nisso, e em como sempre acabamos nos reunindo, na Literária, em torno das obras e das autoras e autores que amamos. De temas que nos movem, que consideramos importantes, pelos quais nos apaixonamos. Para pensar mais sobre romances, contos, poemas, filmes, obras de arte, ensaios e textos teatrais a partir das pesquisas de pessoas que trabalham com literatura, mas que gostam, principalmente, de ler e de conversar sobre o que leem. Para falar do Brasil e de outros lugares do mundo, da nossa vida e de vidas muito diferentes das que levamos e conhecemos. A gente faz isso, mas a forma como fazemos é suficiente? Existem outras maneiras de continuar fazendo o que fazemos? Deveríamos considerar mudar alguma coisa?
É também por causa dessa vontade de fazer melhor o que amamos fazer que estou disponibilizando um formulário anônimo e bem curto, com apenas cinco perguntas de múltipla escolha, para que vocês possam nos dar sugestões e palpites e nos ajudar a preparar o próximo ano da Literária. O formulário está disponível aqui. Ao final, quem quiser pode se identificar (mas não precisa), fazer pedidos e deixar opiniões e sugestões mais extensas, que serão muito bem-vindas. É tudo muito rápido, simples e vai fazer uma baita diferença para nós, que fazemos a Literária em conjunto.
Capturas do filme Carol (2015), de Todd Haynes, com as atrizes Rooney Mara e Cate Blanchett. O filme foi baseado no romance homônimo de Patricia Highsmith, e vamos conversar sobre ambos no nosso curso de novembro
E por falar em fazer a Literária em conjunto, o curso de novembro, nossa última atividade de 2022, está sendo desenvolvido a quatro mãos e vai ser ministrado a duas vozes. E não poderia ser diferente: As mulheres que escreveram Nova York nasceu de conversas animadas entre a professora Marcela Lanius e eu, mas foi ela quem elaborou e ministrou de forma muito especial e aprofundada as duas primeiras edições, em que lemos e debatemos a metrópole e outros espaços dos Estados Unidos através das obras de autoras do século XIX até o final dos anos 1940. Para essa terceira edição, em que vamos mergulhar na década de 1950, a Marcela vai contar com a colaboração e a companhia da professora Emanuela Siqueira. A Manu, que pesquisa e traduz os poemas da estadunidense Elise Cowen no doutorado, escreveu a dissertação de mestrado sobre os cadernos da poeta, além de outros ensaios e artigos que foram publicados em diferentes periódicos. Ela também escreveu sobre Sylvia Plath e, mais recentemente, sobre Diane Di Prima, duas autoras que também estão na bibliografia do curso.
É bem comum eu me sentir repetitiva quando falo das atividades da Literária, mas eu acho, de verdade, que o curso de novembro vai ser muito bacana. Uma das autoras que vamos ler e debater com a Marcela e a Manu é Patricia Highsmith, criadora do personagem Tom Ripley (bastante conhecido devido à adaptação de O Talentoso Mr. Ripley para o cinema, dirigido por Anthony Minghella e que conta com Matt Damon no papel do protagonista) e autora de Carol. Publicado originalmente como The Price of Salt (ou O preço do sal) em 1952, o romance narra o encontro de uma balconista e cenógrafa, Therese, e uma dona de casa rica e mais velha, Carol, casada com um homem e mãe de uma menina. A adaptação fílmica desse romance, lançada em 2015 e dirigida por Todd Haynes, dá atenção especial aos gestos, aos olhares, aos sorrisos das duas personagens — aos detalhes sutilmente aparentes de um relacionamento privado e profundo que nasce e se desenvolve publicamente, sob o escrutínio de uma sociedade machista.
Capturas do filme Carol (2015), de Todd Haynes, com as atrizes Rooney Mara e Cate Blanchett. O filme foi baseado no romance homônimo de Patricia Highsmith, e vamos conversar sobre ambos no nosso curso de novembro
E se falamos dos Estados Unidos dos anos 1950, é também para pensarmos o Brasil dos anos 1950, de outros tempos e da nossa década. Acompanhamos os mais variados relatos de mulheres que tiveram seus votos controlados pelos maridos e parceiros nas últimas eleições, ou que foram simplesmente impedidas de votar por eles. Se lemos e conversamos sobre Carol, é para falar das alegrias que foram, são ou poderiam ser, mas também o fazemos para falar das violências que ainda persistem. E de muitos assuntos mais.
As gravações das aulas da 3a. edição de As mulheres que escreveram Nova York ficarão disponíveis até o dia 31 de janeiro de 2023 para todo mundo que se inscrever. E também é possível se inscrever para assistir às gravações da 1a. e da 2a. edições do curso e acompanhar a Marcela falando sobre muitos livros incríveis, desde Mulherzinhas (1868), de Louisa May Alcott, até contos da Carson McCullers, publicados na passagem da década de 1940 para a década de 1950. Todas as informações e a lista de obras e autoras estão disponíveis na página do curso, e as inscrições ficarão abertas até o meio-dia do dia 14 de novembro. As vagas são limitadas.
Nossa primeira atividade de 2023 vai acontecer, muito provavelmente, depois do Carnaval. Até lá, continuamos em contato pelo perfil da Literária no Instagram, por e-mail ou pelos comentários daqui. Escrevam quando quiserem.
Abraços e até breve,
Roberta
Ansiosíssima para o curso desse mês! <3